"AO RITMO DO CANTE

É tão grande o Alentejo, que não sobra espaço para a imaginação. O que olhamos é só o que vemos e a Terra estende-se até aos confins da ilusão.

De Mértola a Marvão o Fotógrafo viaja como turista, levado sem saber por onde, por lonjuras e planuras, ao encontro de formosas moiras encantadas e de patrimónios milenares, embalado por essa herança berbere que se revela no Cante.

E é das “modas” do Cante que retira a inspiração, plagiando alguns cantares no que vai escrito em continuação...
Mas é Setembro, o sol abrasa a terra, só há sorrisos à sombra do luar... As moças não saem pró campo de raminho na mão e as cigarras já terão morrido.

No restolho ardente resiste a sombra de uma azinheira e lembramos que Fernando Pessoa já aqui (não) via...

Nada com só nada à volta
E umas árvores à mistura
Nenhuma delas verdura,
Que rio ou flor não enflora.
Se há inferno, dei com ele,
Pois se não é aqui, onde diabo será ele?

Mas o Fotógrafo há-de ir andando, enquanto o Pessoa ficou em casa chorando...

Ao passar o Guadiana pôs o pé, molhou a meia, e pôs mais que o pé, pois que a canícula derretia o xisto, contorcido em impressionantes formas fluídas moldadas pelas forças telúricas e pelas enxurradas invernais no Pulo do Lobo.

O Fotógrafo há-de amar uma pedra... por honra e respeito aos homens que as transformaram em miragens de castelos de vento por entre águas vermelhas de sangue e ácido das Minas de S. Domingos.

Mas o Fotógrafo cansou-se de solidão, volta a matar saudades nas ondas do Alqueva, e com outra “água” rubra que o encanta, com o seu perfume e paladar, e que enfernizava a vida dos frades do Convento da Orada... Tanto Alentejo há no seu sabor!

Matar o bicho é essencial, mas o que mais fascina o Fotógrafo são as sombras e os contrastes de luz do Alentejo, nas aldeias, montes e capelas, onde já não fala a voz de Deus, sobre a cal desfeita e a alvura. E há sempre sombra para mais um, nas ruas estreitas, vicinais, enfeitadas com vasos pouco floridos e engelhados estendais.

Caminha agora sobre mármore na abonecada terra estremoceira, afamada pela UNESCO, e chega a tempo de um pôr do sol sem par, em Marvão onde o horizonte desaparece nas brumas da história e o Fotógrafo se revela noturno, nas aluadas ameias do castelo.

O que faço aqui?!... Questiona-se agora o Fotógrafo em final de epopeia raiana...

Mudo o presente com o olhar, porque também sou dos que acreditam que os sonhos não são em vão... Com Paz e Amor no coração."


Texto escrito por: Paulo Cavaleiro
Fotografias por: Afonso Correia (@o__arc)
DAY 2
DAY 3
DAY 4
DAY 5
ALÉM TEJO
Published:

ALÉM TEJO

Published:

Creative Fields